Jovens mulheres do oeste paulista contam como se apaixonaram pelo automobilismo e refletem sobre a participação das mulheres no esporte
Por Marianne Santana (repórter) e Leandro Pinheiro (edição)
03/10, às 17h30
Em Presidente Prudente (SP), a paixão pela Fórmula 1 vem conquistando cada vez mais jovens mulheres, que se identificam com o automobilismo não apenas como espectadoras. A relação delas com as corridas vai muito além da TV: passa por redes sociais, encontros de carros, discussões em grupos online e até pelo desejo de transformar esse interesse em carreira.
Foi no TikTok que a estudante de Publicidade e Propaganda da Escola de Comunicação e Estratégias Digitais (ECOPP), Ana Laura Marchioli, descobriu a Fórmula 1. “De 2021 para 2022, comecei a ver muitos edits emocionantes sobre os pilotos. Quanto mais pesquisava, mais me apaixonava pelo esporte”, conta. Ana Laura começou a seguir perfis de jornalistas, equipes e até fóruns internacionais, absorvendo curiosidades sobre estratégias de corrida, engenharia dos carros e bastidores das equipes.
A jovem também lembra com carinho da exposição de 50 anos da Fórmula 1 no Brasil que visitou, em 2022, em Interlagos (SP): “Um dos dias mais felizes da minha vida, chorei vendo um carro de Daniel Ricciardo de perto”.

Hoje, ela não apenas acompanha todas as etapas que consegue, mas também alimenta a própria conta na rede social com conteúdos de Fórmula 1. Torcedora da Ferrari, Ana Laura sonha em seguir carreira no jornalismo esportivo, inspirada por profissionais como Mariana Becker, e vê na presença feminina no esporte um reflexo direto de suas próprias possibilidades.
“Ver mulheres conquistando espaço, seja no jornalismo ou como engenheiras e estrategistas, me faz acreditar que eu também posso estar nesse meio”, afirma.
Já a estudante de Direito, Nicole de Souza Oliveira, levou essa paixão para além da tela. Jogando videogame com o irmão, começou a se interessar mais pelas corridas de F1 e percebeu que sua curiosidade não se limitava ao resultado final das provas. O passo seguinte foi participar de encontros de carros em Presidente Prudente e, mais recentemente, ir a provas de carros, motos e até caminhões em Londrina (PR), onde pôde sentir a vibração da torcida e a intensidade do esporte de perto.
“Na TV já é emocionante, mas ver os carros a poucos metros é de tirar o fôlego. Gosto também de observar a precisão dos mecânicos nos boxes, é quase uma coreografia”, explica.
Também torcedora da Ferrari, Nicole vê no time tradição, paixão e consistência: “Não é só uma equipe, é a alma da Fórmula 1”.

A jornalista Nellise Pinheiro, também prudentina e egressa da ECOPP, descobriu a Fórmula 1 por um caminho diferente: a série Drive to Survive, da Netflix. Antes disso, afirmava não se interessar pelo esporte, mas a produção despertou sua curiosidade sobre os bastidores, estratégias e a intensidade da competição. “Eu mesma dizia que não gostava de Fórmula 1, até conhecer de verdade. A série abriu as portas para entender o que há por trás das corridas”, relembra.
Desde então, Nellise acompanha cada etapa dos torneios. O momento mais marcante, segundo ela, foi a vitória de Charles Leclerc em Mônaco, em 2023. “Saber da história dele e da relação com o pai tornou aquela conquista ainda mais emocionante. Eu chorei como se fosse uma vitória pessoal”, lembra.

🏁 Dados revelam desigualdade
O entusiasmo das fãs contrasta com a baixa presença feminina no automobilismo profissional. De acordo com a FIA Women in Motorsport, as mulheres representam apenas 1,5% dos titulares de licenças de piloto em todo o mundo, o que dificulta o avanço da presença das mulheres até a Fórmula 1.
Além das pistas, a mídia também contribui para a exclusão: estudo da Women in Sport (2019) mostra que apenas 4% da cobertura televisiva e online da Fórmula 1 é dedicada a mulheres.

Na gestão e nos bastidores, algumas iniciativas representam avanços: a criação da F1 Academy, categoria voltada exclusivamente para mulheres, e a liderança de Fabiana Ecclestone como vice-presidente da FIA na América do Sul. Ainda assim, a representatividade feminina segue baixa.
Projetos paralelos, como a equipe Formula Equal, idealizada para ter 50% de funcionárias mulheres, tentam equilibrar o cenário. Mas ainda dependem de aprovação da Federação Internacional de Automobilismo (FIA), além de investimentos e patrocínios, para se concretizar.
🏎️ Crescimento das telespectadoras

Apesar das barreiras, as mulheres já representam mais de 40% do público global da Fórmula 1. No Brasil, essa presença tem se fortalecido especialmente por meio das redes sociais. Entre dezembro de 2024 e maio de 2025, publicações no TikTok com as hashtags #F1 e #Formula1 cresceram 57%, ultrapassando 4 bilhões de visualizações somente no país.
“Já ouvi comentários de que mulher só acompanha por causa da beleza dos pilotos, mas é óbvio que não é isso. Eu não ia acordar de madrugada só por isso”, rebate Ana Laura.
Para ela, a paixão pelo esporte vai muito além do glamour: envolve estratégia, técnica, precisão nos boxes e histórias por trás das corridas.
Para Nellise, a relação aos estereótipos é alimentada pela mídia, mas o esporte chegou em um ponto de ruptura. “Nos últimos anos, a Fórmula 1 teve uma mudança de posicionamento. Ela entendeu que a forma que ela estava seguindo era muito conservadora e exclusiva. Esse é o primeiro ano que a gente tem uma engenheira mulher”, celebra.
Nicole reforça que a experiência de acompanhar corridas ao vivo em encontros de carros ou provas em outras cidades torna o esporte ainda mais fascinante. “Não é só assistir: é sentir a velocidade, a tensão, a coordenação dos mecânicos. E perceber que mulheres podem estar em qualquer função, não só torcendo, é inspirador”, conclui.
